CRIs dobram e batem R$39 bi: o que mudou após novas regras do CMN

Publicado em 21 de outubro de 2025
Mercado Imobiliário
CRIs dobram e batem R$39 bi: o que mudou após novas regras do CMN

Quando olho para o cenário de financiamento do mercado imobiliário em 2024, não posso deixar de admirar como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) resistiram e até floresceram após as mudanças impostas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Parece até contraintuitivo: restrições maiores, mas um aumento recorde nas emissões? É exatamente isso que vimos, e foi surpreendente observar, com dados mostrando que entre janeiro e agosto de 2024 os CRIs dobraram em relação ao mesmo período do ano anterior, atingindo impressionantes R$ 39 bilhões.

O que são CRIs e por que esse título atrai tanto interesse?

Quando busco entender o apelo dos CRIs no setor imobiliário, sempre chego a três pontos principais:

  • Permitem às empresas antecipar recursos de imóveis vendidos na planta, recebíveis de aluguéis ou parcelamentos.
  • São bastante populares, representam cerca de 10% dos recursos de todo o setor de construção.
  • Oferecem isenção de Imposto de Renda para pessoa física, algo inegavelmente atraente para investidores que buscam bons rendimentos líquidos.

Na prática, a mecânica não é tão complexa. Uma incorporadora, por exemplo, converte recebíveis futuros (aquelas parcelas ou alugueis ainda a receber) em títulos negociáveis. Os investidores compram esses papéis, adiantando os recursos para o caixa da empresa e, em troca, recebem remuneração competitiva, e isenta de impostos na pessoa física.

No Portal Cri, meu objetivo é sempre contextualizar como essas estruturas podem destravar capital para o desenvolvimento imobiliário. É fascinante perceber o quanto o próprio investidor comum passou a enxergar o CRI como parte central de uma carteira diversificada.

Nova orientação do CMN: o que mudou em fevereiro de 2024?

Reunião com documentos do Conselho Monetário Nacional sobre CRIs Vi, em 2024, uma virada importante para os CRIs. Em fevereiro, o Conselho Monetário Nacional resolveu colocar alguns freios no que vinha acontecendo nos últimos anos. Até então, muitas operações, inclusive de setores como educação e varejo, estavam sendo lastreadas por CRIs, aproveitando os mesmos benefícios fiscais pensados para o setor imobiliário.

Com a nova resolução, agora somente recebíveis genuinamente ligados ao mercado imobiliário podem compor a base desses títulos. Ou seja:

  • Não é mais permitido emitir CRI para operações que não pertençam ao setor imobiliário.
  • O acesso ao benefício se concentrou em empresas como incorporadoras, loteadoras, hotéis e toda a cadeia da construção civil.

Mudanças regulatórias sacudiram o mercado, redirecionando benefícios para setores que realmente constroem e movem a economia.

Ao conversar com especialistas e operadores, percebi uma espécie de consenso: o mercado precisava dessa mudança. Daniel Wainstein, da Seneca Evercore, definiu a regra como uma correção de rumo, priorizando o setor que mais gera empregos no Brasil.

O impacto foi imediato em diversos aspectos. Sectores de fora do imobiliário perderam acesso, mas as incorporadoras e construtoras viram novas oportunidades de captação.

Os efeitos na prática: mais recursos e menor custo

Na minha análise, posso afirmar que um dos efeitos mais diretos dessas mudanças foi a migração do volume de emissões para empresas do mercado imobiliário. Dados apontados em reportagens do Valor Investe já antecipavam esse movimento, embora alertassem que, no primeiro momento, poderíamos vivenciar quedas nas emissões.

O que ninguém esperava era o salto: de R$ 19,5 bilhões em CRIs para os atuais R$ 39 bilhões em oito meses. O mercado ajustou. Empresas que de fato constroem e desenvolvem projetos passaram a captar mais, e com custos menores.

Segundo Luis Miraglia, também da Seneca Evercore, com a saída das empresas alheias ao setor, houve menos concorrência, e isso derrubou as taxas de emissão para as incorporadoras. Um efeito de cadeia benéfico para o próprio setor imobiliário.

Taxas menores para captar recursos significam projetos mais viáveis, mais obras, mais empregos.

Para mim, ficou claro nas conversas com gente do mercado e em análises especializadas que o reajuste veio para fortalecer quem realmente depende desse tipo de crédito estruturado. Entre os exemplos concretos, Miguel Mickelberg, da Cyrela, afirmou que metade do endividamento da empresa (R$ 3,4 bilhões, desconsiderando a CashMe) já acontece via CRI.

O mercado imobiliário ganhou destaque renovado e, em muitos casos, tornou-se fonte quase exclusiva desse tipo de captação.

Benefícios se espalham entre empresas; interior ganha espaço

Em 2024, notei que os efeitos da nova regra não ficaram restritos aos grandes centros. Pequenas e médias construtoras, inclusive fora do Sudeste, passaram a acessar os CRIs com mais facilidade. Lucas Drummond, da Opea Securitizadora, pontua que houve, de fato, uma queda no valor médio das operações.

A média caiu para R$ 87,8 milhões neste ano, uma redução de 22,5% em relação a 2023, o que revela foco maior das operações em negócios tipicamente imobiliários, que costumam envolver projetos de menor valor em relação aos CRIs que contemplavam varejo ou educação. Isso, por incrível que pareça, democratizou ainda mais o acesso a essa fonte de recursos.

Vista aérea de cidade do interior com pequenas construtoras e obras imobiliárias Se antes as grandes capitais centralizavam as emissões, agora as construtoras dos interiores, das cidades médias, também passaram a viabilizar empreendimentos usando esse canal. Como resultado, o setor experimentou equilíbrio regional. Em minha opinião, isso é um ponto positivo para o desenvolvimento habitacional no Brasil como um todo.

Fundos imobiliários mudam o foco e LCIs perdem espaço

Outro efeito imediato e que percebi a partir dos relatos dos participantes do mercado foi o reposicionamento dos fundos imobiliários. Com menos opções de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), já que agora elas precisam de prazos mais longos para atrair o benefício fiscal, muitos fundos voltaram a priorizar os CRIs emitidos por incorporadoras.

Com o fiador público das regras, os CRIs se consolidaram ainda mais como alternativa para captar recursos de forma ágil.

Vi, inclusive, que essa mudança também se relaciona à busca de liquidez por investidores. Como o prazo mínimo das LCIs aumentou, os títulos perderam mercado para os CRIs, que, apesar de terem lastro de longo prazo, conseguem ser estruturados com flexibilidade maior quanto a vencimento e amortização.

Esses ajustes trouxeram, de certa forma, um equilíbrio esperado pelo próprio segmento de tributação aplicado aos títulos imobiliários. Agora, o incentivo fiscal se volta realmente para operações que impulsionam o mercado de imóveis.

Impactos nas emissões: o que dados e especialistas concluem?

Ainda na linha de avaliação dos impactos, um levantamento noticiado pelo Clube FII indica que se as novas regras do CMN tivessem valido desde 2023, nada menos do que 34% dos CRIs e 26,5% dos CRAs daquele ano não teriam sido permitidos (segundo análise do Clube FII).

Com menos concorrência, a seletividade aumentou, e empresas do setor viram espaço para crescer.

É claro, surgem novos tipos de risco. O investidor precisa estar atento ao tipo de operação, análise do lastro imobiliário e à estrutura de garantia. Costumo indicar o acompanhamento dessas informações em fontes com credibilidade, como o próprio Portal Cri, que mantém uma seção sobre riscos do crédito estruturado imobiliário.

Carlos Ferrari, advogado especialista em estruturação de operações, comenta que, com as mudanças, bancos perderam espaço nesse segmento. O funding dos projetos passou a ser dominado por incorporadoras via CRIs, que agora encontram menos barreiras regulatórias e taxas mais baixas.

Nesse cenário, vejo uma chance maior para empresas aumentarem autonomia financeira, reduzindo dependência bancária e acelerando o ritmo de lançamentos e construção. Não há dúvida: o CRI tornou-se um protagonista ainda mais relevante na agenda de funding imobiliário do país.

O que esperar? Reflexões e próximos passos

Confesso que não imaginava ver tamanho crescimento dos CRIs logo após a edição das regras mais restritivas. O setor imobiliário provou ter musculatura e apetite, especialmente diante do cenário macroeconômico mais previsível. Mesmo com possíveis ajustes no horizonte, minha percepção é de que o caminho percorrido foi acertado.

Algumas tendências e cuidados se desenham a partir desse novo cenário:

  • Empresas precisam atenção redobrada na estruturação dos CRIs, já que a seletividade aumentou.
  • Investidores devem aprofundar a análise de riscos e garantias antes de aportar.
  • Empreendedores fora dos grandes centros têm chance de viabilizar projetos inéditos com menos concorrência.

Para quem busca dados, análises e tendências deste universo, o Portal Cri se mantém como seu espaço confiável para entender o crédito estruturado imobiliário, suas oportunidades e seus desafios. Conheça mais sobre o nosso trabalho, mantenha-se informado e fortaleça a sua tomada de decisão no setor!